29 Maio 2020

Entrevista a Pedro Rio, Cardiologista do Centro do Coração dos Hospitais CUF (Lisboa)

Os portugueses consomem em média cerca de 10g de sal por dia, o dobro do recomendado pela Organização Mundial da Saúde, o que tem consequências muito negativas para a saúde do coração e de outros órgãos muito importantes.

São inúmeros os malefícios do consumo exagerado de sal para a saúde do coração, sendo o principal a pressão alta ou hipertensão arterial, ou seja, pressão acima de 140 mmHg de sistólica, a máxima, e acima de 90 mmHg de diastólica, a mínima. Por sua vez, a hipertensão arterial aumenta o risco de enfarte agudo do miocárdio e de insuficiência cardíaca, entre outras doenças. De acordo com o cardiologista Pedro Rio, a quantidade de sal consumida deve ser inferior a 2 gramas de sódio, isto é, menos de 5 gramas de sal por dia, o que corresponde a menos de uma colher de chá.

 

O SAL NÃO É AMIGO DO CORAÇÃO


Os portugueses têm noção real da quantidade de sal que consomem e das consequências do consumo excessivo para a sua saúde?

Apesar de haver muita informação sobre este tema e os portugueses conhecerem os malefícios do uso excessivo de sal, de uma forma geral, subestimam o seu consumo. Se perguntarmos a uma pessoa se ingere sal a mais, a resposta é automaticamente não, o que contradiz os estudos de consumo de sal em Portugal.

 

Qual a quantidade média de sal consumida por cada português, actualmente?

De acordo com os últimos estudos, os portugueses consomem em média cerca de 10 gramas de sal por dia, o dobro do recomendado pela Organização Mundial da Saúde.

 

Qual é a quantidade recomendada?

A quantidade deve ser inferior a 2g de sódio, isto é, menos de 5g de sal por dia, o que corresponde a menos de 1 colher de chá. Não nos podemos esquecer de que o sal, ou o sódio, está presente em todos os alimentos de forma natural.

 

INIMIGO SILENCIOSO

Quais os efeitos do sal a mais no nosso organismo?

O sal é formado por 40% de sódio e o restante de cloreto. O nosso sangue apresenta uma concentração de sódio muito bem equilibrada. O sódio ao ser ingerido em excesso vai ultrapassar a capacidade que o rim tem em excretá-lo na quantidade suficiente para manter o tal equilíbrio. Isto vai levar a que o rim tenha de reter mais água para manter a concentração do sódio. É este excesso de água dentro do nosso organismo que vai fazer com que aumente a pressão dentro dos vasos sanguíneos. A hipertensão arterial, por sua vez, vai criar um problema a todo o sistema cardiovascular, induzindo lesões dentro da camada mais interna das artérias, podendo levar à sua rotura ou estimulando a aterosclerose, que é a deposição de placas de gordura e de cálcio. A aterosclerose é o primeiro passo para o enfarte agudo do miocárdio ou para a principal forma de acidente vascular cerebral (AVC), o AVC isquémico. Tudo isto acontece geralmente de forma indolor e silenciosa.

 

Quais são neste momento as doenças que se devem directamente ao consumo excessivo de sal?

O sal, por aumentar a pressão arterial, pode assim causar AVC, aneurismas, enfarte agudo do miocárdio, insuficiência cardíaca e renal.

 

É PRECISO ELIMINAR RESISTÊNCIAS

A resistência a reduzir a quantidade de sal prende-se com a cultura gastronómica nacional?

Os principais alimentos que servem de fonte ao excessivo consumo de sal são o pão, a charcutaria, a sopa e o sal adicionado, que são alimentos que existem em todos os lares portugueses. De alguma forma não conseguimos fazer a ligação entre aquilo que [comemos] e as consequências em termos de saúde.

 

Que desafios aponta no processo de sensibilização dos portugueses para este problema?

As campanhas de sensibilização para redução do sal não podem ficar só pela identificação do problema nem da consciencialização que se impõe. Devem apontar num sentido mais prático. O que comer e como o fazer usando temperos como especiarias e ervas aromáticas em alternativa ao sal. Apontar sempre para alimentos mais frescos com menor processamento possível dando exemplos de pequeno-almoço, almoço e jantar como refeições saudáveis.

 

O programa Menos Sal Portugal marca uma viragem no sentido desta melhor consciencialização? 

Este tipo de iniciativa é muito importante. Além de lembrar à população os perigos do sal, os resultados mostram que é possível uma menor ingestão de sal no dia-a-dia e que isso leva à redução da pressão arterial sistólica de 2,1 mmHg. Pode parecer pouco, mas significa uma diminuição do risco de doenças cardiovasculares, nomeadamente, de 10% na mortalidade por AVC ou de 9% por doença coronária.